Para astronautas, maior desafio não é ir ao espaço, mas voltar

11/03/2013

Não demorou para eu descobrir que o desafio para mim não era ser um operador indo à Lua. Era voltar e ser uma pessoa aqui na Terra, diz Buzz Aldrin Foto: Nasa / Divulgação



Não demorou para eu descobrir que o desafio para mim não era ser um operador 
indo à Lua. Era voltar e ser uma pessoa aqui na Terra, diz Buzz Aldrin
Poucos seres humanos têm a possibilidade de deixar a Terra. A viagem ao espaço, seja para uma volta na Lua ou vivência na Estação Espacial Internacional, é o ápice da carreira dos astronautas. Alguns dedicam a vida inteira a esse objetivo. Mas muitos dos que realizam esse sonho descobrem que o retorno à Terra pode ser tão difícil quanto a partida. 
Em entrevista coletiva em 2009, no Rio de Janeiro, Buzz Aldrin, o segundo homem a pisar na Lua, revelou: “Não demorou para eu descobrir que o desafio para mim não era ser um operador indo à Lua. Era voltar e ser uma pessoa aqui na Terra”. Quarenta anos antes, no dia 20 de julho de 1969, Aldrin desceu as escadas do módulo lunar e declarou: “Linda, linda. Desolação magnífica”. A frase inspirou o título de sua última autobiografia, “Desolação magnífica: a longa jornada da Lua para casa”, de 2009. Nela, Buzz descreve o grande vazio enfrentado após o retorno à Terra e questiona: "O que um homem pode fazer como segundo ato depois de andar na Lua?". 
Além de todo o esforço para chegar aonde nenhum homem havia ousado e da pressão política inerente ao tamanho da tarefa que se divisava, o astronauta teve de enfrentar um drama familiar no período que antecedeu a chegada à Lua: sua mãe, Marion Moon, atormentada por uma depressão e pela iminência da fama do filho, cometeu suicídio um ano antes do pouso histórico da Eagle. Depois de conquistar a Lua e ver seu casamento de 21 anos fracassar, Aldrin também cedeu à depressão - e à bebida. Na palestra realizada na Campus Party Brasil 2013, em São Paulo, no dia 29 de janeiro, desabafou: “Eu não tinha previsto o tamanho da notoriedade que a missão me traria. Foi nessa época que comecei a beber, e os sintomas da depressão começaram a aparecer. Foi um período obscuro da minha vida. Quase uma década de improdutividade”.


De acordo com o astronauta, ir à Lua não é tão desafiador quanto voltar à Terra e ter de lidar com o restante da humanidade. Quem parecia concordar era o seu colega de viagem, Neil Armstrong, o primeiro homem a pisar na lua, que morreu aos 82 anos, em agosto de 2012. Logo após a saga da Apollo 11, o astronauta retirou-se da Nasa e passou a viver recluso, aparecendo somente em solenidades do governo sobre a exploração espacial.
Por mais que tentasse se manter longe dos holofotes, Armstrong era bastante assediado por aqueles que não acreditavam que o homem tivesse pisado na Lua. Em 1994, parou de dar autógrafos e tirar fotos ao descobrir que eles eram vendidos em sites de leilão por até US$ 50 mil. Nesse mesmo ano, processou uma empresa de cartões de crédito dos EUA por usar sua histórica frase “Um pequeno passo...” em cartões e decorações de Natal. Em 2005, processou seu barbeiro de mais de 20 anos por vender mechas de seu cabelo por US$ 3 mil.
Os integrantes da Apollo 11 não foram os únicos a enfrentar um retorno à Terra transformador. James Irwin, oitavo homem a pisar na Lua, na Apollo 15, que morreu em 1991, afirmou sentir a presença de Deus mais forte do que nunca durante a viagem espacial. Ao retornar ao nosso planeta, tornou-se um fanático religioso. Deixou a Nasa, em 1972, e fundou a missão cristã High Flight, com a qual afirmava: “Jesus andando sobre a Terra é mais importante do que o homem andando na Lua”. No ano seguinte, comandou diversas expedições ao Monte Ararat, na Turquia, na esperança de encontrar os restos da Arca de Noé. As buscas se mostraram infrutíferas e, na última expedição, Irwin se feriu gravemente, retornando aos EUA.
Outro astronauta que teve uma experiência intensa em seu regresso foi Edgar Mitchell, tripulante da Apollo 14 e sexto homem a pisar na Lua. Ele descreve assim a sua “expansão de consciência”: “Na volta para casa, olhei pela janela, e é uma experiência poderosa ver a Terra surgindo sobre a Lua. E subitamente percebi que as moléculas do meu corpo e as moléculas da espaçonave foram concebidas por uma geração antiga de estrelas. Em vez de ser uma experiência intelectual, foi um sentimento pessoal. Aquelas eram minhas moléculas. Isso foi acompanhado por uma sensação de alegria e êxtase que me levaram a perguntar: 'O que é isso?'. Depois de voltar, pesquisei e descobri que aquela experiência, em sânscrito antigo, se chamava 'Samadhi'. É uma experiência transformadora". A narrativa foi retirada de uma entrevista para o site do Instituto de Ciências Noéticas, fundado pelo astronauta em 1973, para estudar a consciência e a intuição.
Essa expansão da consciência e mudança de prisma levaram o cientista e entrar em conflito com a Nasa. Mais de uma vez, ele deu entrevistas afirmando que óvnis avistados eram mesmo de extraterrestres e que essas informações eram acobertadas pelo governo. Em 23 de julho de 2008, Mitchell, em entrevista à Kerrang Radio, da Inglaterra, disse que o acidente de Roswell fora realmente protagonizado por extraterrestres. “Fui muito privilegiado em ter estado num grupo restrito que sabia que temos tido visitas em nosso planeta e que o fenômeno óvni é real. Existem extraterrestres, e muitos óvnis têm visitado a Terra e realizado contatos de terceiro grau com funcionários da Nasa”, relatou. 
Dois anos mais tarde, o governo americano entrou com um processo contra Mitchell ao descobrir que ele havia colocado a leilão uma câmera usada pela tripulação da Apollo 14. O ex-comandante da Nasa teve de devolver a câmera, que passou a integrar a exposição do Museu Nacional Aéreo e Espacial, em Washington. Esse é um embate recorrente entre astronautas e a agência espacial americana, pois todos os objetos utilizados durante as missões são de posse do governo. Em 2012, Jim Lovell, da Apollo 13, tentou leiloar um caderno de anotações, mas foi impedido pela agência.
A falta de perspectivas pode dificultar o retorno à Terra. Por isso Marcos Pontes, o primeiro astronauta brasileiro a ir ao espaço, em 2006, não quer nem saber de se aposentar. “Nossa mente não foi feita para ficar parada ou olhar simplesmente para o passado”, explica. “Precisamos de novos sonhos e metas. Certamente as condições do voo espacial causam emoções, estresse, isolamento, novidade e desconforto físico. Mas nós temos que encontrar sentido na vida depois de uma missão espacial. A missão, embora seja um grande feito em qualquer situação, não é o ponto mais alto da nossa vida”, relata.
Depois de sua missão na Estação Espacial Internacional, o astronauta brasileiro já escreveu três livros, deu centenas de palestras e cursos, tornou-se embaixador da ONU e empresário. “É isso que faz com que não tenhamos qualquer efeito psicológico negativo”, revela. Astronauta na ativa, à disposição do Brasil, Pontes sonha com o próximo voo e espera que isso aconteça em breve, ressaltando que existem muitas possibilidades para isso. Questionado sobre o futuro, o astronauta confidencia: “Espero muita coisa do futuro, e isso vai afetar muito positivamente o Brasil e os brasileiros. Espere e verá”.